Por Ana Alice Barros e Thawane Maria

Imposto pela pandemia de Covid-19, a tecnologia digital se tornou o principal meio para dar continuidade ao ano letivo em escolas ao redor do mundo. Apesar de ter sido a alternativa mais viável no início, esbarrou na desigualdade de renda, acesso à tecnologia no Brasil, e dificuldade dos professores em se adequar à modalidade. 

 

Fatores como esses, somados ao método expositivista de ensino pouco atrelado à realidade dos alunos, mostram porque em 2020 houve um aumento na evasão escolar no Brasil. Cerca de 1,3 milhão de estudantes, entre 6 e 17 anos, abandonaram os estudos no último ano, segundo dados revelados na pesquisa “Enfrentamento da cultura do fracasso escolar”, publicada em janeiro de 2021, pelo Fundo das Nações Unidas pela Infância (Unicef)

Para Fredson Murilo, mestre em educação pela Universidade Federal de Pernambuco, o modelo tradicional de ensino, onde professores expõem assuntos e alunos aprendem de forma passiva, apenas escutando, já não se adequa à realidade da sala de aula. A educação precisa de inovação para continuar cumprindo com o seu papel social. “A gente vive numa era tecnológica, e quando falamos em inovações educacionais, não estamos nos referindo a instrumentos caros e de difícil acesso, mas sim ferramentas conhecidas pelos estudantes e que tomam um novo propósito a partir da intervenção do professor junto ao aluno”, ressaltou.

 

“As novas metodologias educacionais têm como missão facilitar a aprendizagem do aluno, empregando princípios como o empoderamento e participação do estudante. São ferramentas que podem ajudar o aluno no processo de aprendizado. Os alunos de hoje não aprendem como antigamente. Estamos ensinando estudantes do século XXI”, concluiu o professor. 

 

A tecnologia imersiva pode ser uma das novas ferramentas de ensino. Quem  defende é Rosilene da Silva, mestre em sociologia pelo Mestrado Profissional de Sociologia em Rede Nacional (ProfSocio). Seu projeto de pesquisa propõe o uso do óculos de realidade virtual para o aprofundamento do ensino. Com ele, os alunos podem absorver os conteúdos de uma maneira mais natural. “Através da utilização dos óculos de RV, este aluno poderá aprofundar seus conhecimentos nos temas abordados ‘vivenciando’, na prática, o que antes era teorizado. Isso torna o ensino  mais atrativo para o jovem que é considerado um nativo digital”, comenta a mestre. 

 

A falta de acesso à informação e a desigualdade social são fatores que dificultam o uso dessas novas tecnologias. Por se tratarem de uma inovação, alguns professores podem não conhecer ou supor que são distantes da sua realidade. Uma pesquisa feita pelo Comitê Gestor da Internet do Brasil escancara ainda mais a desigualdade, e mostra que nem todos os jovens da geração Z têm a mesma oportunidade. Em 2020, cerca de 19% da população brasileira não teve acesso à internet. 

 

Essa realidade é vivenciada todos os dias pela professora da rede pública de Pernambuco, Cássia Diniz. “Eles sabem muito de instagram, filtro, YouTube, redes sociais no geral. Mas quando falamos em tecnologias educacionais, os estudantes, infelizmente, não estão. Existe muita resistência por parte de professores e alunos em se aprofundar, eles acreditam que o básico já é suficiente”, disse. 

 

Ela relata que, dos 50 estudantes matriculados na sua disciplina, apenas 8 compareciam regularmente às aulas remotas. Destes que aparecem, dividiam a atenção com algum trabalho que arranjaram durante a pandemia para complementar a renda familiar. 

 

O Prof. Dr. António Rochette, da Universidade de Coimbra, em Portugal, realça a importância da formação continuada de professores. “A partir do momento que você desperta o docente a procurar o novo, no âmbito da educação, instiga também o aluno que vai ser beneficiado por essa iniciativa”.

 

“Para os alunos é normal, para a gente é algo inovador.”, comenta António

 

Ele também fala sobre a importância do professor estar conectado com a realidade do aluno. “Quando falamos sobre novas tecnologias, são novas para nós [professores], que somos velhos. Se pretendemos elaborar uma enquete usando o smartphone, para os alunos é normal, para a gente é algo inovador. Por isso precisamos trabalhar com os professores para que eles consigam trabalhar com novas metodologias educacionais, entendendo as especificidades de cada escola, trabalhando com os seus alunos, cativando-os”, ressaltou. 

 

Os estudantes são quem lidam com essas diferenças no ensino de maneira mais intensa. Quem veio do ensino privado e vai para o público por vezes percebe o atraso nos conteúdos lecionados nas escolas públicas. É o caso de Júlya Witória, estudante do 2º ano do Ensino Médio, do Erem Senador Paulo Guerra Pessoa. “Antes, quando eu estudava numa escola particular, no ensino fundamental, os assuntos passados eram muito avançados, coisa de 1º ano do ensino médio. Quando cheguei na escola pública, no 8° ano, eles estavam passando conteúdos que os alunos de escola privada já haviam aprendido no 6° ano”.

 

Parcerias entre escolas e instituições podem ser uma alternativa para o ensino público, usando poucos recursos. O Laboratório Multiusuários em Humanidades (MultiHLab) desenvolve projetos em parceria com as escolas, disseminando o uso das tecnologias digitais no ensino em Humanidades, principalmente na área das Ciências Sociais, usando poucos recursos.

 

“O uso de atividades realizadas com tecnologias imersivas, neste caso a Realidade Virtual, proporciona uma experiência ao aluno de estar em ambientes (alheios ou familiares a eles) que busquem despertar o olhar sociológico em situações cotidianas que antes passavam despercebidas. Essa tecnologia, antes mais direcionada para os estudos da área de exatas e saúde,  pode ser disseminada nas áreas de humanidades. Estudar sociologia,  por exemplo, abre um leque de opções e possibilidades de trabalhar conteúdos que podem ser produzidos de forma coletiva, com os alunos, e proporcionar o aprofundamento dos conteúdos abordados em sala”. Destaca Rosilene

 

Além da realidade virtual, a formação de professores também é um caminho. Fredson Murilo coordena o Programa de Residência Docente nas Ciências (Redec), que, além de preparar o graduando para o cotidiano na sala de aula, incentiva a formação continuada de professores no interior de Pernambuco. “O caminho é árduo e o resultado do que estamos fazendo neste momento não vai chegar de uma hora pra outra. Mas não podemos ficar parados, o maior bem de um país é a educação, e é por ela que estamos começando”, finalizou. 

 

Em 2022, com a ampliação da vacinação e estabilização dos casos, escolas públicas e privadas estão voltando ao ensino presencial. Porém, independente do formato, a tecnologia influenciou o ensino e a relação entre professor e aluno, modificando a forma tradicional de ensino. Tratada como solução temporária, essa ferramenta promete ficar. 

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